Quando a fumaça branca subir aos céus do Vaticano, encerrando o conclave para escolha do sucessor do papa Francisco, o novo pontífice continuará com símbolos e tradições seculares que envolvem o líder da Igreja Católica. Isso inclui mudanças nos trajes. Ao contrário do ditado, neste caso a vestimenta faz o monge e cada detalhe da roupa do papa carrega um símbolo ou significado religioso.
“As vestes usadas pelo papa têm um valor simbólico profundo que expressa sua missão espiritual, sua autoridade e o legado histórico da Igreja”, explica o filósofo Hugo Brandão, doutor em Ciências da Religião e coordenador do programa de pós-graduação sobre o tema no Instituto Federal de Alagoas (Ifal). “Cada peça das vestes papais comunica visualmente dimensões profundas da fé, da tradição e do serviço pastoral do líder máximo da Igreja Católica”, complementa Brandão.
Conhecido por sua simplicidade e aversão à ostentação, Francisco, que em vida fez voto de pobreza, renegou vários adereços de luxo em suas roupas. O principal deles foi substituir o tradicional crucifixo de ouro dos papas por outro bem mais simples e discreto, confeccionado em prata, que o acompanhava desde os tempos em que era arcebispo de Buenos Aires. O santo padre também dispensou os finos mocassins italianos vermelhos e sempre preferiu os calçados comuns, pretos, feitos sob medida pelo sapateiro argentino Carlos Samaria.
Por outro lado, Francisco valorizava muito a cor branca em suas vestes e adereços. O uso oficial do branco na roupa do papa, que simboliza a pureza, a inocência e a paz, foi instituído durante o papado de Pio VI, no século 18. Antes disso, a cor mais utilizada era a vermelha, que representa o sangue e o martírio vivido por Jesus Cristo.
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“A batina branca é, talvez, o símbolo visual mais imediato e reconhecível do papa, representando a pureza e dedicação total a Deus, bem como o distingue visualmente de todos os outros clérigos”, explica Brandão, que acrescenta: “Na fé católica, essas vestes e seus símbolos não são apenas adereços, e sim sinais concretos da presença de Cristo na figura do papa, fortalecendo a fé, a reverência e o senso de unidade dentro da Igreja”.
Durante o conclave, período em que ainda não se sabe quem vai ocupar o trono de Pedro e muito menos o tamanho da sua roupa, são confeccionadas e guardadas três batinas brancas, nos tamanhos pequeno, médio e grande.
Após o resultado da eleição e aceitação da sagrada missão por parte do escolhido, uma das três batinas prontas será imediatamente vestida no novo papa, de acordo com o peso e altura aproximados. Há relatos de ajustes improvisados, feitos de última hora. Em 1958, por exemplo, logo após ter sido aclamado, João XXIII teria aparecido na varanda para acenar aos fiéis com alfinetes para ajustarem a parte de trás da batina.
Seguindo o ritual, a cúpula do colégio de cardeais conduz o novo líder católico à varanda central da Basílica de São Pedro, no Vaticano. Será a primeira aparição e benção aos fiéis na Praça de São Pedro, após o famoso anúncio “habemus papam” (temos um papa).
A seguir, confira as principais peças que compõem a roupa do papa:
Batina
A peça totalmente branca é exclusiva do papa. A cor representa a pureza e a paz. Ela tem 33 botões, que representam a idade de Jesus, e cinco abotoaduras em cada punho, que simbolizam as chagas de Cristo.
Solidéu (chapéu do papa)
Gorro em forma de cúpula inicialmente utilizado para proteger a cabeça dos religiosos nas frias igrejas medievais, o acessório tornou-se símbolo de total dedicação a Deus. Também é utilizado por outros religiosos, e a cor varia de acordo com o nível hierárquico na Igreja: branco (papa), roxo (bispos) e vermelho (cardeais). É retirado durante as cerimônias.
Múleo
Sapatos finos de couro confeccionados a mão, sob medida e na cor vermelha, que representa o martírio de Cristo. Francisco dispensou o modelo e preferia sapatos pretos mais simples, mas seu antecessor, Bento XVI, era adepto fervoroso dos luxuosos múleos, uma de suas marcas registradas.
Casula
Do latim “pequena casa”, é o manto que cobre a batina do religioso durante as celebrações litúrgicas. Simboliza a sujeição do sacerdote a Deus. As cores da casula variam conforme o período litúrgico da cerimônia, tais como: branco (missas de Natal e Páscoa), vermelha (missa do Domingo de Ramos), verde (celebrações comuns) e roxo (missas e atos na Quaresma).
Crucifixo
Utilizado em tempo integral pelo pontífice, mostra que os religiosos carregam a cruz, símbolo maior da Igreja Católica, no coração.
Anel de São Pedro
Símbolo oficial do papado, representa a missão do maior representante de Jesus Cristo na Terra. É também chamado de anel do pescador em alusão a Pedro, apóstolo de Jesus e primeiro papa da Igreja Católica. Após a morte de um papa, o anel é quebrado. Além de simbolizar o fim do papado, a destruição da joia também tinha o objetivo de evitar o uso indevido do anel na época em que o acessório era usado como carimbo.
Estola
Adereço longo e estreito utilizado em volta do pescoço e pendendo sobre os ombros. Assim como a casula, representa a sujeição a Deus e é utilizada sempre em atos litúrgicos.
Mitra
Chapéu alongado e pontudo criado no século 10 para diferenciar o papa dos outros religiosos. Utilizado em ocasiões solenes, como miss